PEC 51:
proposta de mudança radical das polícias
Categoria:
Jurídicos,
Polícia
e Política | Autor: Danillo Ferreira
em outubro 1, 2013
Senador
Lindbergh Farias (PT-RJ) – Autor da PEC 51. Foto: Assessoria.
Os que
acompanharam e acompanham o jogo político em torno da tentativa de aprovação do
Piso Salarial Nacional para os policiais e bombeiros brasileiros flagraram a
atuação do Governo Federal, e de sua base aliada, para barrar a medida – que
ficou popularizada como “PEC 300″, embora mudanças tenham ocorrido no conteúdo
da proposta. Por isso, chama a atenção que uma referência nacional do Partido
dos Trabalhadores, o senador Lindbergh Farias (PT-RJ), tenha apresentado uma
Proposta de Emenda Constitucional que altera radicalmente a atual configuração
das polícias brasileiras, a PEC 51.
Confira
abaixo algumas das medidas contidas na PEC, que engloba muitas reivindicações
majoritárias nas polícias (lembrando que, em alguns casos, a maioria nem sempre
“vence”):
- DESVINCULAÇÃO DAS FORÇAS ARMADAS: “A fim de prover segurança pública, o Estado deverá organizar polícias, órgãos de natureza civil, cuja função é garantir os direitos dos cidadãos, e que poderão recorrer ao uso comedido da força, segundo a proporcionalidade e a razoabilidade, devendo atuar ostensiva e preventivamente, investigando e realizando a persecução criminal”;
- CARREIRA ÚNICA: “Todo órgão policial deverá se organizar por carreira única”;
- CICLO COMPLETO: “Todo órgão policial deverá se organizar em ciclo completo, responsabilizando-se cumulativamente pelas tarefas ostensivas, preventivas, investigativas e de persecução criminal.”;
- AUTONOMIA DOS ESTADOS: “Os Estados e o Distrito Federal terão autonomia para estruturar seus órgãos de segurança pública, inclusive quanto à definição da responsabilidade do município, observado o disposto nesta Constituição, podendo organizar suas polícias a partir da definição de responsabilidades sobre territórios ou sobre infrações penais.”;
- OUVIDORIAS INDEPENDENTES: “O controle externo da atividade policial será exercido por meio de Ouvidoria Externa, constituída no âmbito de cada órgão policial, dotada de autonomia orçamentária e funcional, incumbida do controle da atuação do órgão policial e do cumprimento dos deveres funcionais de seus profissionais”.
Luiz
Eduardo Soares (Antropólogo e Ex-secretário Nacional de Segurança, autor de
“Elite da Tropa”, fez parte da construção da PEC 51. Foto: Arquivo do autor.
Para
construir a Proposta, o senador Lindhberg – que é pré-candidato a Governador
do Rio de Janeiro – contou com o auxílio de Luiz Eduardo Soares,
Ex-secretário Nacional de Segurança Pública, Antropólogo e autor de vários
estudos e livros na área de segurança pública. Em seu perfil do
facebook, Luiz Eduardo comentou a apresentação da PEC:
“Com
grande alegria, depois de anos de trabalho e ansiedade, comunico a apresentação
pelo senador Lindbergh Farias (RJ) da PEC 51/2013 (desmilitarização e muito
mais). Foi um privilégio participar da elaboração da proposta. Um longo e
difícil parto. Mas aí está. Começa a tramitar no Senado. Será examinada na CCJ.
Não creio que seja aprovada, pois promoveria uma verdadeira revolução na
arquitetura institucional da segurança pública. Mas pelo menos agora há uma
bandeira concreta pela qual lutar e um caminho apontado. Muitos discordarão,
outros concordarão, mas um modelo está aí, sobre a mesa para o debate público.
Um passo
foi dado com essa proposta de reforma constitucional, saindo daquele dilema
pobre e insolúvel, unifica ou não, como se não houvesse todo um vasto universo
de possibilidades. A PEC 51/2013 propõe a desmilitarização, polícias de ciclo
completo organizadas por territórios ou tipos criminais, carreira única no
interior de cada instituição, maiores responsabilidades para a União e os
municípios, controle externo com ampla participação social. Polícia é definida
como instituição destinada a garantir direitos, comprometida com a vida, a
liberdade, a equidade. E as mudanças dar-se-ão ao longo de um tempo
suficientemente elástico para evitar precipitações. Todos os direitos
trabalhistas dos profissionais serão integralmente respeitados.
Cada
estado terá a liberdade de tomar suas próprias decisões, com ampla participação
popular, escolhendo a solução mais adequada a suas características, a partir de
um repertório que a Constituição definirá –em havendo o acolhimento da PEC–,
nos termos acima expostos. Se a PEC for aprovada, estará decretado o fim do
sistema institucional que a ditadura nos legou e que tem impedido a
democratização do país, nesse campo tão sensível e estratégico, sobretudo para
os grupos sociais mais vulneráveis. Se a PEC for acolhida, estará iniciado o
desmonte das tenazes que a ditadura deixou plantada no coração da democracia
brasileira. Estará aberta a porta para a transformação profunda das culturas
corporativas que impedem a identificação dos agentes da segurança pública com
os valores da cidadania.
Agora, é
preciso trazer a proposta ao conhecimento da sociedade, dos movimentos e
continuar, nas praças públicas, o diálogo que vem sendo travado há anos com os
profissionais das polícias, privadamente, por motivos óbvios –entre os quais, o
veto à sindicalização dos policiais militares, que também ficará no passado se
tivermos êxito. A PEC terá impacto benéfico também para os policiais. Além da
carreira única (que interessa aos não-oficiais e aos não-delegados, a imensa
maioria dos trabalhadores policiais), propõe mecanismos que protejam os
profissionais das violações a seus direitos perpetrados por suas próprias
instituições. A luta prossegue, mas agora, espero, em outro patamar. Parabéns
pela coragem, Lindbergh. Sei que vai haver muito desgaste porque o
corporativismo das camadas superiores das instituições reagirá, assim como
setores conservadores da mídia e da opinião pública. Mas talvez um dia a
sociedade em seu conjunto talvez reconheça o avanço que essa iniciativa pode
promover.”
Em um só
documento propostas significativas foram reunidas, que certamente receberão uma
enxurrada de contraposições ideológicas e, principalmente, corporativistas –
como já ocorre contra cada uma delas em separado. De qualquer modo, parece
significativo que um aliado do alto escalão do Governo Federal esteja
interessado em discutir medidas progressistas para a reforma das polícias
brasileiras.
Vamos ler, estudar e
nos posicionar sobre cada um dos itens, todos eles centrais se quisermos
pensar novas polícias.
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